O sapo, o escorpião e o dólar

É curioso notar que alguns analistas, nesta semana, expressaram surpresa diante da valorização do dólar frente ao real, especialmente nos últimos dois dias. Para mim, a verdadeira surpresa foi ter demorado tanto para o câmbio ter tido esse comportamento. Este ano tem sido desfavorável à moeda brasileira, que começou o ano cotada em torno dos R$ 4,85 e ultrapassou a marca dos R$ 6 hoje, maior cotação nominal da história até então.

Fonte: Bloomberg, L2 Capital

A ausência de credibilidade do atual governo na condução da economia, aliada à falta de responsabilidade fiscal não deveria surpreender ninguém. Absolutamente ninguém. No entanto, pelo visto, aparentemente a maioria dos participantes de mercado só agora se deu conta de que não haverá corte de gastos decente e que o país está à deriva, com despesas crescendo bem acima da inflação, o que pode turbinar o ritmo de crescimento da dívida brasileira, possivelmente levando-a a um caminho sem retorno.

O pacote de corte de gastos anunciado ontem pelo ministro Fernando Haddad, embora já esperado há algumas semanas, revelou-se decepcionante. Mesmo que todas medidas sejam aprovadas pelo Congresso, o que ainda é incerto, a economia projetada é de cerca de R$ 30 bilhões para 2025 e de R$ 70 bilhões para 2026. Muito bom, verdade? O problema é que o déficit brasileiro já supera a marca de R$ 1 trilhão nos últimos doze meses, de sorte que esses cortes representam uma fração mínima e terão impacto insignificante no cenário fiscal do país.

Quando Lula foi eleito e o dólar não disparou — chegou, inclusive, a recuar — alertei, tanto em artigos quanto no Twitter (X) que aquela era uma benção para quem ainda tinha dinheiro em reais e se via diante da possibilidade de dolarizar ativos. Na época fui alvo de críticas e recebi mensagens pouco cordiais (alerta de eufemismo) questionando minha análise e oferecendo contrapontos apaixonados. Infelizmente, no universo dos investimentos, é essencial olhar para frente e projetar cenários com um horizonte de 18 a 24 meses. Caso contrário, sujeitamo-nos ao risco de sermos surpreendidos pelos eventos e nos tornarmos vítimas do mercado.

Naquela ocasião, destaquei que não era necessário transferir todo o capital para o exterior, mas que era uma excelente oportunidade para dolarizar parte do patrimônio. O Brasil representa aproximadamente 1% do mercado financeiro mundial e, por consequência estatística lógica, existem várias outras oportunidades de investimento muito melhores fora do país. Além do mais, para quem reside no Brasil, manter uma diversificação de moedas é uma estratégia importante e saudável — como evidencia a atual conjuntura econômica.

A trajetória do PT no poder é marcada por episódios difíceis de explicar internacionalmente, muitas vezes comparáveis à fábula do escorpião e do sapo, que tematiza as escolhas autodestrutivas. Retirada da Wikipedia, a história é simples: um escorpião pede a um sapo que o leve através de um rio. O sapo tem medo de ser picado durante a viagem, mas o escorpião argumenta que se picar o sapo, o sapo iria afundar e o escorpião iria se afogar. O sapo concorda e começa a carregar o escorpião, mas, no meio do caminho, o escorpião acaba por ferroar o sapo, condenando ambos à morte. Quando perguntado pelo sapo por que havia lhe picado, o escorpião responde que esta é a sua natureza e que nada poderia ser feito para mudar o destino.

Essa metáfora parece apropriada para decisões políticas que, mesmo contrárias ao interesse comum, acabam prevalecendo pela própria “natureza” das partes envolvidas, levando o país a cenários difíceis de justificar e, em última instância, prejudiciais a todos.

A natureza da esquerda é essa e não deveria causar surpresas. Há mais de cem anos, em diversos países ao redor do mundo, temos exemplos claros que ilustram esse padrão. Mesmo assim, o mercado escolheu ignorar as lições da história e “fazer o L”, assumindo uma postura que, ao longo do tempo, tem se mostrado ingênua ou excessivamente otimista. Essa atitude reflete, talvez, uma crença de que “desta vez será diferente”, contudo, os desdobramentos tendem a seguir o mesmo roteiro: promessas insustentáveis, políticas desconectadas da realidade econômica e, por fim, impactos adversos para a estabilidade financeira. Ignorar os precedentes é, no mínimo, um erro estratégico que o mercado parece repetir ciclicamente.

Para se ter uma ideia da natureza do PT, temos o exemplo emblemático do caso da JBS, cujos controladores admitiram ter subornado diversos políticos. Apesar de terem sido multados e afastados, a empresa continua a prosperar. Recentemente, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu uma multa de R$ 10,3 bilhões imposta à J&F, controladora da JBS, no âmbito de um acordo de leniência.

Outro caso é o da Odebrecht, envolvida em escândalos de corrupção revelados pela Operação Lava Jato. Em 2020, a empresa mudou seu nome para Novonor e, apesar de ter sido proibida de participar de obras públicas, voltou a disputar contratos governamentais. Atualmente, a Novonor está na fase final de uma licitação para retomar as obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, com um projeto estimado entre R$ 6 bilhões e R$ 8 bilhões.

A Andrade Gutierrez, também implicada na Lava Jato, está concorrendo com a Novonor pelo mesmo contrato na refinaria da Petrobras. Esses exemplos ilustram como empresas envolvidas em escândalos de corrupção conseguem, após breves períodos de afastamento, retornar ao mercado e disputar contratos públicos de grande magnitude.

Falando em Abreu e Lima, é importante lembrar que ela se destaca como a refinaria mais cara da história, com custos superiores a US$18,5 bilhões para processamento potencial de 115 mil barris de petróleo por dia. A título de contraste, na Coreia do Sul, uma refinaria capaz de processar 800 mil barris por dia, custou menos de US$5 bilhões para ser implementada, segundo economistas do IBRE.

Como disse George Santayana, aqueles que não podem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo. Espero realmente que o salto nas taxas de juros futuros e a rápida escalada do dólar façam com que o governo “diminua o ímpeto” (vídeo: REUNIÃO DE EMERGÊNCIA) e resolva realmente cortar gastos e destravar o potencial que todos sabemos que o Brasil tem.

Não, esse não é o fim do Brasil. Devemos refrear nossas inclinações emocionais e analisar friamente os cenários. Para quem conhece bem e sabe o que está fazendo, essa pode ser uma excelente oportunidade para selecionar bons ativos, sejam eles de renda fixa ou de renda variável. Mesmo assim, o conselho de ter uma parte do patrimônio em moeda forte permanece válido.

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