Recentemente, todos ouvimos falar sobre aquele que seria o “Trump trade”, em outras palavras, a aposta mais promissora no mundo dos investimentos para aproveitar de uma nova administração Trump. A mais popular, de longe, foi o “drill baby, drill”, ou seja, o investimento no setor de óleo e gás.
Sempre consideramos curioso como o mercado demonstra ter uma memória fraca, especialmente para eventos relativamente recentes. Na primeira administração Trump, esse também era o “trade” mais recomendado, contudo, o setor de óleo e gás não teve o desempenho esperado, enquanto o de tecnologia, que estava em segundo plano, decolou.
Atualmente, parece que todos estão apostando novamente no setor de petróleo e gás, e se distanciando do setor de cannabis. Não pretendemos, de maneira alguma, fazer previsões sobre qual setor se beneficiará no curto-prazo, já que isso não se encaixa na nossa filosofia de investimentos ou nos permite gerar valor com consistência. No entanto, acreditamos que a cannabis possa ser um dos beneficiados em uma administração Trump.
Obviamente, “essa é uma pílula difícil de engolir” para quem viu o comportamento do mercado ontem. Houve a confirmação da vitória dos Republicanos, a não-aprovação do uso recreativo de cannabis na Flórida, o que resultou em uma queda acentuada nas ações de algumas empresas na bolsa — nenhuma delas, vale destacar, fazia parte do nosso portfólio, que passou praticamente incólume a essa tormenta.
Mais uma vez, a narrativa parece seguir na direção oposta à realidade, o que sempre nos leva a refletir sobre possíveis oportunidades de investimento. A grande verdade é que os Republicanos são melhores que os Democratas quando o assunto é cannabis, mas, por algum motivo que nos escapa, essa não é a percepção predominante.
Entendemos que a Flórida, com seu governador Republicano, possui o mercado de cannabis medicinal mais desenvolvido dos EUA – e, possivelmente, do mundo. Ainda assim, persiste a visão superficial de que os Democratas são os mais favoráveis e benéficos ao setor. Em contraste, estados Democratas, como Nova Iorque e Califórnia, apresentam algumas das legislações mais restritivas nessa seara.
Atribuímos parte da queda observada ontem ao fato de os Republicanos terem saído vitoriosos nas eleições, mas também ao fato de o mercado estar se dando conta da fonte do crescimento das famosas multi state operators (MSOs). Já mencionamos isso em diversas oportunidades: as grandes empresas do setor têm um modus operandi muito óbvio e previsível. Elas entram em um novo mercado, onde a competição seja praticamente inexistente, montam uma estrutura multimilionária — afinal, o dinheiro que vem fácil, também vai fácil —, e começam a vender seus produtos.
Em função da baixa competitividade nesses novos mercados, os preços praticados são altos e os custos são mal administrados. Contudo, isso pouco importa, já que o preço de venda elevado propicia margens expressivas e a disciplina gerencial fica renegada. À medida que o mercado amadurece, as empresas perdem a capacidade de se diferenciar, uma vez que seus produtos não são melhores, não há marcas consolidadas, não há inovação, resultando em quedas nas vendas. Com custos fixos elevados e contratualmente amarrados por muitos anos à frente, as MSOs assistem a uma rápida e agressiva deterioração de suas margens, outrora robustas, que se tornam negativas, forçando a drástica decisão de sair do mercado. Naturalmente, ao saírem, culpam o estado, alegam falta de regulação sólida, e competição desleal.
Até ontem, isso não representava um grande problema, dado que sempre havia outros serem“explorados”. Assim, numa abordagem nomádica, essas empresas saiam de um mercado considerado pouco atrativo e partiam para outro novo, onde pudessem repetir seu modus operandi, obter margens altas e, assim, sustentar o crescimento.
Até ontem, só existiam dois grandes vetores de crescimento em vista: a Flórida e o Minnesota — lembrando que o segundo é significativamente menor que o primeiro. O grande revés das eleições para alguns foi que a Flórida, um dos maiores mercados de cannabis do mundo, votou contra a legalização do uso adulto da cannabis. Com isso, a estratégia de crescimento marcada pela ausência de disciplina, de controle de custos, de diferenciação, de branding e de inovação, foi, finalmente, enterrada. E o mercado se deu conta disso, punindo — na nossa visão, com razão — algumas empresas do setor.
Ontem, tivemos conversas com algumas pessoas do mercado que nos perguntaram se agora seria um bom momento para comprar ações dessas empresas, as MSOs, já que elas haviam caído muito e, possivelmente, poderiam entregar um excelente retorno nos próximos 6 ou 12 meses. Honestamente, não sabemos afirmar se elas trarão bons retornos, embora tenhamos convicção de que elas não se tornarão empresas melhores ou melhores modelos de negócios tão breve assim. A analogia que se aplica aqui seria com o campeonato brasileiro de futebol. Quem estaria disposto a apostar que os dois piores times do campeonato brasileiro deste ano, Goianiense e Cuiabá, vão liderar a série A no próximo ano?
Só porque estão em baixa, não quer dizer que serão os líderes amanhã. Muito pelo contrário, a experiência nos mostra que apostar nos vencedores é uma estratégia vencedora e deve ser replicada sempre que possível. Como já disse Paul Tudor Jones, losers average losers.
Da mesma forma, apostar na política ao investir em cannabis não é investimento, é especulação na sua mais pura essência – algo não fazemos e tampouco recomendamos. Pode até dar certo, mas não se encaixa naquilo que nos propomos a fazer. Preferimos selecionar as empresas que julgamos mais sólidas e mais preparadas para não apenas sobreviver, mas também para crescer de forma consistente, enfrentando quaisquer adversidades. Isso exige esforço e trabalho árduo, mas, em dias como esses, nos permite dormir tranquilos.
Além disso, acreditamos firmemente que nossas empresas se beneficiarão do movimento que está se iniciando. A indústria de cannabis continua crescendo nos EUA e as empresas bem-posicionadas estão prontas para tirar proveitos substanciais das dificuldades enfrentadas pelos concorrentes. Quanto mais o setor se complicar para as grandes, mais oportunidades surgirão para nossas empresas e maiores serão nossos retornos prospectivos.
Conforme destacamos em nossa última carta, nosso fundo já acumula alta de mais de 80% em dólar neste ano, enquanto o proxy MSOS, amplamente seguido pelo mercado, apresenta queda de quase 30%. A disparidade entre nosso desempenho e o do MSOS é enorme — é extremamente raro ver um setor recuar tanto e um fundo, focado exclusivamente nesse setor, registrar concomitantemente um crescimento tão expressivo.
Estamos extremamente entusiasmados com o futuro do setor e de nossas empresas.